Conteúdo da Apostila - Tópicos Especiais - II
Parte II de III - Curso de Capacitação em Psicanalise - SPOB-POLO/RS
Em
tempos atuais o rápido envelhecimento dos países em desenvolvimento vem
acompanhado de rápidas e drásticas mudanças nas estruturas e nos papeis da
família, bem como nos padrões de trabalho e migração. A migração dos jovens
para as cidades para estudar, à procura de trabalho, famílias menores, mulheres
em maior numero tornando-se força de trabalho formal, significam que menos
pessoas estão disponíveis para cuidar de daquelas que estão envelhecendo, e que
venham necessitar de cuidados especiais.
A feminização do envelhecimento se deve ao
fato de que as mulheres vivem mais em quase todos os lugares do mundo. As
mulheres hoje correspondem aproximadamente a quase dois terços da população
acima de setenta e cinco anos no Brasil e em países em desenvolvimento. As mulheres têm a vantagem
da longevidade, mas são vítimas mais freqüentes da violência doméstica e da
discriminação em relação á educação, salário, alimentação, trabalho
significativo, assistência á saúde, herança, medidas de seguro social e poder
político. Apontando essas desvantagens cumulativas significa que as mulheres,
mais que os homens tendem a ser mais pobres, e apresentarem mais deficiências
em mais avançada, ou seja, ao chegar à velhice.
A sociedade, com esse breve preâmbulo,
evidencia a presença cada vez maior de idosos, assim como uma série de
problemas de ordem social, econômica e ética que acompanha essa nova realidade.
Se por um lado há um sentimento de triunfo e sucesso, por outro há uma sensação
de despreparo para enfrentar as dificuldades que decorrem e um desamparo e
abandono enquanto ser humano.
A resistência é algo que parte dos aspectos
neuróticos do paciente. Ele evita mais sofrimentos, arraigando-se a velhos
padrões (compulsão à repetição) para não enfrentar a sua verdade: a verdade do
inconsciente que emerge do inconsciente nos sintomas, os atos falhos e sonhos,
etc. Caberá ao analista suportar as resistências e caminhar com o tratamento,
ele também resiste, muitas vezes, preso à técnica na qual foi treinado em sua
formação, e não ficar atento à sua própria neurose, ou seja, seus pontos cegos
que o impedem de acolher certos temas e mesmo pessoas.
No caso da psicanálise com idosos,
quando se pesquisa bibliografia sobre o tratamento com esse grupo etário há
pouco material publicado. Analistas contemporâneos relatam casos bem sucedidos
com pacientes idosos (King, 1980; Coltart, 1991), o terreno ainda não fica
muito claro para muitos profissionais da área.
O desenvolvimento psicológico pode ser
entendido como uma progressiva adaptação às demandas do mundo interno e
externo, e os pacientes velhos procuram o tratamento ou o profissional quando
ocorre uma falha nos mecanismos adaptativos do desenvolvimento, segundo Sandler
(1984). Contratransferencialmente, o velho é percebido como um ser frágil. O
terapeuta por sua vez se encontra, então, sob a influência de uma onipotência
negativa, que induz o temor de que as próprias palavras possam destruir o
paciente idoso, percebido como extremamente frágil e vulnerável. Isso ocorre
com terapeutas mais jovens. Esse tipo de contratransferência, segundo Abraham
(1980), coloca o terapeuta na posição de uma criança frente a um genitor debilitado,
necessitando de ajuda, e pode provocar nele o temor da própria agressividade
potencial, que embora reprimida e oculta, pode escapar ao controle.
As sociedades em diferentes épocas
entenderam o conceito de “velhice” de formas diversificadas. Freud mostrou que
o conceito de idoso tem contornos fluidos, quando termina de escrever seu
artigo “Moisés e o monoteísmo” (1938), um do mais brilhante trabalho, aos 81
anos de idade, em pleno gozo de vivacidade, criatividade e sagacidade.
Hoje temos cada vez mais o velho
presente em cena social. No entanto a sociedade super valoriza a juventude que
está associada a sucesso, felicidade e beleza. O velho ao contrário, não está
no mercado competitivo de trabalho, é feio, possui rugas, um corpo feio e
flácido, não dominam a moderna tecnologia, portanto podem ser descartados,
rejeitados e abandonados, sem serventia. O psicanalista é parte desta sociedade
e absorve muito de seus valores. A pressão social do sucesso profissional como
psicanalista, o lança numa rede imaginária de uma clientela que produzirá que
será reconhecido, que fará fortuna, entre outras coisas, ma existe uma ética
profissional que barra tais fantasias, e que o coloca atento aos próprios
desejos. Ele ocupa um determinado lugar, não é atemporal, e vive num mundo onde
velhice e morte, estão cercadas de mito e são evitadas de modo cada vez mais
eficaz.
Por outro lado, à medida que se
percebe mais elasticidade de comportamentos permitidos a todas as faixas
etárias, os papeis esperados já não se definem em termos de grades de idade,
mas por projetos de vida individual que vão produzindo trajetórias especificas
a cada individuo. Hoje muitos indivíduos que estão na idade da velhice, assim
definida pela organização mundial de saúde, aos 60 anos nos países em
desenvolvimento como o Brasil (65 nos países desenvolvidos) vêm recusando
abandonar sua inserção na sociedade e forçando sua presença como cidadãos dependendo
do lugar que ocupa num pai com uma realidade tão heterogênia, tornando-se
necessário um olhar mais atento a fim de buscar uma apreensão que inclua varias
dimensões.
Uma
das primeiras dificuldades de um paciente idoso ao procurar o tratamento
psicanalítico é a oferta de profissionais voltados para esse tipo de clientela.
Ao iniciar o tratamento dificuldades comuns a todos os pacientes, como custear
o tratamento, disponibilidade de freqüentar regularmente as sessões, e muitas
outras. O que é relevante considerar é o que traz uma pessoa com mais idade
procurar um analista, o que a faz sofrer, do que se queixa. Para a psicanálise
cada caso é entendido em sua singularidade. O idoso hoje está em profunda
transformação em conseqüência da demanda da sociedade pós-moderna. Os idosos
urbanos estão sendo atingidos pelas relações fluidas, pelos valores e certezas
cada vez mais mutantes. Construíram valores pessoais e verdades ao longo de
muitos anos, e talvez quase tudo o que pensam e sabem possa ser desmentido,
negado ou até ridicularizado.
Os idosos nos falam de outros
sintomas como as perdas de imagem corporal convivendo com uma sociedade que
valoriza o corpo perfeito, diferente de outro tempo em que as gordurinhas eram
saudáveis e até desejadas. Porém as dores psíquicas dos idosos não ficam na
superficialidade da aparência física. Toda a rede familiar foi revolucionada,
fazendo uma total desordem familiar segundo Roudinesco, onde o velho está na
primeira de uma terceira geração de descendentes, onde o idoso está cada vez
mais só e isolado. Muitos se deprimem se angustiam e até se suicidam.
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