INSTITUTO FREIDIANO DE ESTUDOS PSICANALÍTICOS

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

O paciente idoso e a clínica

 Conteúdo da Apostila - Tópicos Especiais - II

Parte II de III - Curso de Capacitação em Psicanalise - SPOB-POLO/RS
               Em tempos atuais o rápido envelhecimento dos países em desenvolvimento vem acompanhado de rápidas e drásticas mudanças nas estruturas e nos papeis da família, bem como nos padrões de trabalho e migração. A migração dos jovens para as cidades para estudar, à procura de trabalho, famílias menores, mulheres em maior numero tornando-se força de trabalho formal, significam que menos pessoas estão disponíveis para cuidar de daquelas que estão envelhecendo, e que venham necessitar de cuidados especiais.
             A feminização do envelhecimento se deve ao fato de que as mulheres vivem mais em quase todos os lugares do mundo. As mulheres hoje correspondem aproximadamente a quase dois terços da população acima de setenta e cinco anos no Brasil e em países em desenvolvimento.  As mulheres têm a vantagem da longevidade, mas são vítimas mais freqüentes da violência doméstica e da discriminação em relação á educação, salário, alimentação, trabalho significativo, assistência á saúde, herança, medidas de seguro social e poder político. Apontando essas desvantagens cumulativas significa que as mulheres, mais que os homens tendem a ser mais pobres, e apresentarem mais deficiências em mais avançada, ou seja, ao chegar à velhice.
        A sociedade, com esse breve preâmbulo, evidencia a presença cada vez maior de idosos, assim como uma série de problemas de ordem social, econômica e ética que acompanha essa nova realidade. Se por um lado há um sentimento de triunfo e sucesso, por outro há uma sensação de despreparo para enfrentar as dificuldades que decorrem e um desamparo e abandono enquanto ser humano.
           A resistência é algo que parte dos aspectos neuróticos do paciente. Ele evita mais sofrimentos, arraigando-se a velhos padrões (compulsão à repetição) para não enfrentar a sua verdade: a verdade do inconsciente que emerge do inconsciente nos sintomas, os atos falhos e sonhos, etc. Caberá ao analista suportar as resistências e caminhar com o tratamento, ele também resiste, muitas vezes, preso à técnica na qual foi treinado em sua formação, e não ficar atento à sua própria neurose, ou seja, seus pontos cegos que o impedem de acolher certos temas e mesmo pessoas.
        No caso da psicanálise com idosos, quando se pesquisa bibliografia sobre o tratamento com esse grupo etário há pouco material publicado. Analistas contemporâneos relatam casos bem sucedidos com pacientes idosos (King, 1980; Coltart, 1991), o terreno ainda não fica muito claro para muitos profissionais da área.
      O desenvolvimento psicológico pode ser entendido como uma progressiva adaptação às demandas do mundo interno e externo, e os pacientes velhos procuram o tratamento ou o profissional quando ocorre uma falha nos mecanismos adaptativos do desenvolvimento, segundo Sandler (1984). Contratransferencialmente, o velho é percebido como um ser frágil. O terapeuta por sua vez se encontra, então, sob a influência de uma onipotência negativa, que induz o temor de que as próprias palavras possam destruir o paciente idoso, percebido como extremamente frágil e vulnerável. Isso ocorre com terapeutas mais jovens. Esse tipo de contratransferência, segundo Abraham (1980), coloca o terapeuta na posição de uma criança frente a um genitor debilitado, necessitando de ajuda, e pode provocar nele o temor da própria agressividade potencial, que embora reprimida e oculta, pode escapar ao controle.
          As sociedades em diferentes épocas entenderam o conceito de “velhice” de formas diversificadas. Freud mostrou que o conceito de idoso tem contornos fluidos, quando termina de escrever seu artigo “Moisés e o monoteísmo” (1938), um do mais brilhante trabalho, aos 81 anos de idade, em pleno gozo de vivacidade, criatividade e sagacidade.
           Hoje temos cada vez mais o velho presente em cena social. No entanto a sociedade super valoriza a juventude que está associada a sucesso, felicidade e beleza. O velho ao contrário, não está no mercado competitivo de trabalho, é feio, possui rugas, um corpo feio e flácido, não dominam a moderna tecnologia, portanto podem ser descartados, rejeitados e abandonados, sem serventia. O psicanalista é parte desta sociedade e absorve muito de seus valores. A pressão social do sucesso profissional como psicanalista, o lança numa rede imaginária de uma clientela que produzirá que será reconhecido, que fará fortuna, entre outras coisas, ma existe uma ética profissional que barra tais fantasias, e que o coloca atento aos próprios desejos. Ele ocupa um determinado lugar, não é atemporal, e vive num mundo onde velhice e morte, estão cercadas de mito e são evitadas de modo cada vez mais eficaz.
              Por outro lado, à medida que se percebe mais elasticidade de comportamentos permitidos a todas as faixas etárias, os papeis esperados já não se definem em termos de grades de idade, mas por projetos de vida individual que vão produzindo trajetórias especificas a cada individuo. Hoje muitos indivíduos que estão na idade da velhice, assim definida pela organização mundial de saúde, aos 60 anos nos países em desenvolvimento como o Brasil (65 nos países desenvolvidos) vêm recusando abandonar sua inserção na sociedade e forçando sua presença como cidadãos dependendo do lugar que ocupa num pai com uma realidade tão heterogênia, tornando-se necessário um olhar mais atento a fim de buscar uma apreensão que inclua varias dimensões.        
              Uma das primeiras dificuldades de um paciente idoso ao procurar o tratamento psicanalítico é a oferta de profissionais voltados para esse tipo de clientela. Ao iniciar o tratamento dificuldades comuns a todos os pacientes, como custear o tratamento, disponibilidade de freqüentar regularmente as sessões, e muitas outras. O que é relevante considerar é o que traz uma pessoa com mais idade procurar um analista, o que a faz sofrer, do que se queixa. Para a psicanálise cada caso é entendido em sua singularidade. O idoso hoje está em profunda transformação em conseqüência da demanda da sociedade pós-moderna. Os idosos urbanos estão sendo atingidos pelas relações fluidas, pelos valores e certezas cada vez mais mutantes. Construíram valores pessoais e verdades ao longo de muitos anos, e talvez quase tudo o que pensam e sabem possa ser desmentido, negado ou até ridicularizado.

               Os idosos nos falam de outros sintomas como as perdas de imagem corporal convivendo com uma sociedade que valoriza o corpo perfeito, diferente de outro tempo em que as gordurinhas eram saudáveis e até desejadas. Porém as dores psíquicas dos idosos não ficam na superficialidade da aparência física. Toda a rede familiar foi revolucionada, fazendo uma total desordem familiar segundo Roudinesco, onde o velho está na primeira de uma terceira geração de descendentes, onde o idoso está cada vez mais só e isolado. Muitos se deprimem se angustiam e até se suicidam.

Nenhum comentário:

Postar um comentário