INSTITUTO FREIDIANO DE ESTUDOS PSICANALÍTICOS

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

As Psicopatologias e a Psicanálise

Parte I de III
Conteúdo da Apostila de Psiquiatria e Psicanálise

Curso de Capacitação em Psicanálise-SPOB-POLO/RS
Os ensaios clínicos que testam a eficácia de novas drogas no controle de transtornos psiquiátricos e comportamentais, como a depressão, a dependência química e a esquizofrenia, têm observado resultados melhores quando associam à medicação abordagens psicoterápicas diversas.
Nesta perspectiva, a Associação Americana para a Psiquiatria Acadêmica e a Associação Americana de Diretores de Treinamento em Residência Psiquiátrica defendem a necessidade da aplicação clínica dos conceitos de mecanismos de defesa, dinâmica inconsciente, transferência e contratransferência na prática psiquiátrica. Disto dependeria a efetividade da prescrição dos psicofármacos, das técnicas cognitivo comportamentais e do trabalho psiquiátrico em geral. O exercício adequado da psiquiatria não poderia estar dissociado da utilização de diferentes técnicas psicoterápicas dinâmicas, dependendo das necessidades dos pacientes. A evidência de que diferentes abordagens psicoterápicas breves, com duração e distanciamento terapeuta-paciente específicos, possam trazer resultados positivos para o sujeito enfermo vem se acumulando, nas últimas décadas. A importância de tal fato para a Saúde Pública é enorme.  Ao lado da escassez dos recursos para o investimento em saúde, existe a necessidade de expandirmos os tratamentos dinâmicos para além das classes abastadas das grandes cidades. Devemos, portanto, pensar na capacitação de técnicos, sem a formação longa e custosa em psicanálise, na utilização de diferentes tipos de psicoterapias dinâmicas breves, possibilitando a difusão dos seus benefícios a um número maior de indivíduos na nossa sociedade. A psicoterapia de apoio favorece mais a adaptação intrapsíquica e interpessoal do que mudanças estruturais profundas Em “Psicanálise, psicoterapia psicanalítica e psicoterapia de apoio: controvérsias contemporâneas” (capítulo publicado no livro “Psicanálise contemporânea: revista francesa de psicanálise: número especial, 2001”, organizado por André Green e lançado no Brasil pela Imago, em 2003), o psicanalista Otto Kernberg analisa a relação entre a psicanálise, a psicoterapia psicanalítica e a psicoterapia de apoio, pois reconhece que inúmeros pacientes, por motivos de gravidade das suas patologias e/ou recursos financeiros limitados, não podem ser submetidos à psicanálise clássica. As psicoterapias dinâmicas derivadas da psicanálise teriam utilidade para essas pessoas. Segundo o autor, a psicanálise buscaria uma mudança estrutural fundamental, integrando o conflito inconsciente ou dissociado no ego consciente. A psicoterapia analítica teria uma proposta de mudança do sintoma no “aqui e agora”, o que envolveria mudanças parciais na estrutura fundamental do sujeito. Por outro lado, a psicoterapia de apoio levaria à melhora do sintoma, não por mudanças estruturais, mas por meio de rearranjos na composição dinâmica de impulsos e defesas, reforçando defesas mais adaptativas. O autor observa que tais modalidades diferem na maneira que utilizam o que define como os três elementos fundamentais do método psicanalítico, quais sejam, a interpretação, a análise da transferência e a neutralidade técnica. O abandono da neutralidade técnica pode ocorrer na psicoterapia psicoanalítica, o que permite que o terapeuta, no decorrer da análise, possa intervir em situações externas que colocariam a vida do paciente ou o tratamento em risco. Na terapia de apoio esse abandono seria mais completo. Tal modalidade de tratamento não objetiva a interpretação da transferência, embora atenta a ela. Não obstante, utiliza elementos da técnica interpretativa, como a clarificação e a confrontação, podendo dar apoio cognitivo e emocional ao paciente através da sugestão e do reasseguramento. Além disso, a terapia de apoio pode utilizar uma intervenção direta no ambiente, integrando a família e outros membros da equipe de saúde ao tratamento. Segundo Kernberg, ao contrário da psicanálise clássica, a psicoterapia psicanalítica e a psicoterapia de apoio seriam mais indicadas para o tratamento de casos severos como comportamentos suicidas, distúrbios alimentares, alcoolismo, dependência de drogas e comportamento anti-social exacerbado. A literatura em saúde mental evidencia o efeito similar entre as psicoterapias de curta e longa duração
Na introdução ao livro “Terapia Interpessoal e Dinâmica Breve”(Levenson, H. Et al. Brief Dynamic and Interpersonal Therapy. 2ª Ed, Washington, DC, American Psychiatric Publishing, 2002), os autores observam que as estimativas pontuam que 90% dos indivíduos deixam o tratamento até a décima sessão. Isto não significa total falha no tratamento, porque a metade destes sujeitos relata algum grau de benefício, mesmo no curto tempo de permanência. As psicoterapias de curta duração são melhores do que nenhuma terapia, revelam os estudos de avaliação, que não conseguem demonstrar a superioridade terapêutica dos métodos mais longos sobre as abordagens psicoterápicas mais breves. Existe uma crescente demanda por terapias mais breves, atendendo à limitação dos recursos e às necessidades dos indivíduos de alívio imediato do sofrimento psíquico. As abordagens breves envolvem de seis a 25 sessões. Não são terapias de longa duração “desidratadas”, mas requerem um treinamento especializado, seguindo métodos específicos. Infelizmente, segundo os autores, os clínicos de orientação dinâmica, com trabalhos longos e em profundidade, resistem às técnicas mais breves. São fontes dessa resistência a crença de que quanto mais sessões melhor, o perfeccionismo terapêutico, a confusão entre os interesses do terapeuta e do paciente e a reação negativa acerca da necessidade de centrar o tratamento nas características do paciente. Portanto, não há apenas a necessidade de treinamento em terapias breves, mas de mudança de atitude e de valores em relação à efetividade dessas terapias, considerando a realidade clínica dos seus bons resultados num curto espaço de tempo.