INSTITUTO FREIDIANO DE ESTUDOS PSICANALÍTICOS

quinta-feira, 13 de março de 2014

A PRÁTICA DA INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS

CURSO LIVRE DE CAPACITAÇÃO EM PSICANÁLISE


A PRÁTICA DA INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS
 Introdução ao módulo - Interpretação do sonhos
Introdução
Nós vivemos entre duas realidades, a da vida objetiva (realidade externa) e a vida subjetiva, isto é, a nossa vida psíquica (realidade interna: a realidade que, em verdade desejamos).
A primeira é sempre agressiva e representa, por isso, o desprazer.
A segunda vem ao encontro daquilo que queremos, ou desejamos. Por isto representa o prazer.
Para que exista um equilíbrio entre essas duas realidades, a natureza nos deu a faculdade de sonhar, é através dos sonhos que nós vivemos, na busca de realizemos todos os nosso desejos.
Assim podemos definir os sonhos como uma função psíquica encarregada de compensar, de substituir mesmo uma realidade, que nos é hostil por outra totalmente diferente onde um novo mundo se descortina diante da alma.
A Psicanálise já os definiu como “uma realização de desejos”, entretanto nem sempre a realização onírica consegue este ideal, pois nisto se refere à qualidade do desejo, que em um dado momento, abrigamos. (nem sempre desejamos conscientemente uma coisa), pois há determinados desejos que nos passam como relâmpagos pela cabeça, mas que são imediatamente, condenados pela razão, ou melhor, pela consciência.
Teoria Estrutural do sonho
A teoria estrutural propõe que os conflitos entre as funções das diferentes estruturas dão origem aos aspectos desagradáveis do sonho e do sintoma e explicam o fenômeno da resistência inconsciente.
Procuramos compreender a natureza e função das forças antiinstintivas, assim como os impulsos infantis, instintos, e os seus derivados. Partimos do principio de que ambos os conjuntos de força e equilíbrio instável entre elas são de importância fundamental para determinar a configuração do sonho.
Corretamente, nas horas em que a pessoa esta desperta, o exercício das funções do ego é suficiente para manter um equilibro efetivo. Mas à noite quando o sono enfraquece as funções do ego e corta a ajuda externa, o instinto tem oportunidade de se reafirmar.
O conceito da teoria estrutural proporciona uma ajuda adicional. A teoria estrutural concebe o id como um repositório de impulsos sexuais e agressivos de todas as fases do desenvolvimento. Esses impulsos encontram representação mental no sonho como saída para a satisfação imediata. Mesmo no sonho, defronta-se com as contra-exigências do ego e superego.
As funções de integração e síntese do ego atuam para manter lógica a ordem no sonho.
A função de percepção do ego e o seu desenvolvimento de ansiedade opõem-se aos impulsos derivados do id e modificam a expressão dos mesmos. A organização do ego existe para assegurar também a satisfação instintiva.
O superego manifesta o seu efeito sobre o sonho introduzindo a culpa, o remorso e o castigo pela tentativa de satisfação do desejo infantil proibido. Como extensão do ego o superego também contribui para a criação de ansiedade.
A influência do superego no sonho é tanto sentida como uma aprovação ou como uma condenação.
Nenhum sonho é jamais, exclusivamente um “sonho do id”, se for empregado tal expressão é apenas para indicar que os desejos infantis, os representantes dos impulsos instintos ou de seus derivados são de tal modo fortes que ganham acesso ao sonho com menos distorção do que é usual.
Os sonhos provenientes de baixo, dominados pelos impulsos, sentimentos e idéias do princípio da vida, contêm uma contribuição maior do id do que qualquer outra fonte. Do ponto de vista da teoria estrutural, uma preponderância das representações do impulso sexual ou agressivo da infância reflete do id no sonho.
Nenhum sonho é simplesmente um “sonho do ego”.
Esta seria a designação, em termos de teoria estrutural, daqueles sonhos que contêm uma considerável soma de revisão secundária que incluem fantasias, afetos ou idéias pré-conscientes, elaboradas de antemão ou introduzem impressões sensoriais da realidade extraída da realidade e registram acontecimentos correntes – resíduo do dia.
O “sonho do ego” mostra os efeitos do mecanismo inconscientes de defesa do ego sobre as expressões dos desejos infantis proveniente do id.
Pesquisas mostram que a amnésia para o sonho é, em certa medida independente da repressão, e os sonhos estão sujeitos à ”decomposição espontânea”, a atividade da porção do inconsciente ego determina amplamente se um sonho ou fragmento de sonho será esquecido.
Não obstante as drogas e o tempo ótimo de despertar do sono REM, tanto a recordação e retenção como o esquecimento, a imprecisão e a “inidoneidade” do sonho são, de modo geral, obra da censura e repressão inconsciente do ego e superego.
Isso explica por que o recurso como passar a escrito um sonho no meio da noite ou logo de manhã, ao despertar, é largamente fútil, quando o inconsciente está a postos para contrariar e frustrar a intenção do trabalho analítico.
Nenhum sonho é jamais exclusivamente um “sonho do superego”. Contudo o sonho de punição ou um em que se manifestem insuportáveis sentimentos de culpa indica, inequivocamente, a presença do superego. As palavras faladas em sonho são segundo Isakower (1954), uma contribuição direta do superego para o conteúdo manifesto do sonho.
A dificuldade e complexidade da interpretação do sonho resultam do extraordinário grau em que os pensamentos do sonho latente são deformados no sonho manifesto. Para começar, estão sujeitos a uma distorção que reflete a característica natureza de processo primário da condensação e deslocamento da atividade onírica.
Acrescente-se a isto uma vasta propensão, para a simbolização e as limitações impostas pela representação, mormente em forma visual, das idéias e sentimentos que participam na formação do sonho.
Finalmente a distorção é ainda mais exagerada pelas necessidades conflitantes dos sistemas do aparelho psíquico, incluindo a necessidade do ego de incutir lógicas, ordem e aceitabilidade ao que é considerado ilógico desorganizado e ainda objetável.


quarta-feira, 12 de março de 2014

O múltiplo interesse da psicanálise



O interesse psicológico da psicanálise



A psicanálise é um procedimento médico que aspira à cura de certas formas do nervosismo (neurose). Em um trabalho publicado em 1910 já descrevi a evolução da psicanálise desde seu ponto de partida no método catártico, de J. Breuer, e suas relações com as teorias de Charcot e P. Janet.
Como exemplos das formas patológicas acessíveis à psicanálise podem ser citadas as convulsões e inibiçõesda histeria e os diversos sintomas da neurose obsessiva (atos e idéias obsessivas). Trata-se de estados que desaparecem às vezes espontaneamente e respondem de um modo caprichoso, até agora inexplicado, à influência pessoal do médico. Nas formas graves das perturbações mentais propriamente ditas a psicanálise não alcança resultado positivo algum. Mas tanto nas psicoses1 como nas neuroses nos facilita pela primeira vez na história da medicina uma visão das origens e o mecanismo desses distúrbios.
Esta importância médica da psicanálise não justificaria a tentativa de apresentá-la em um círculo de estudiosos interessados pela síntese das ciências, e muito menos quando tal tarefa pareceria prematura enquanto uma grande parte dos psiquiatras e neurólogos continue mostrando-se oposta ao novo méto do terapêutico e rechace tanto suas hipóteses como seus resultados. Se, não obstante, considero legítima esta tentativa é porque a psicanálise aspira a interessar a praticantes da ciência distintos dos psiquiatras, pois se estende a outros vários setores científicos diferentes e estabelece entre estes e a patologia da vida psíquica relações evidentes.
Deixarei, pois, de lado, por agora, o interesse médico da psicanálise e tratarei de demonstrar, com uma série de exemplos, minhas afirmações anteriores sobre nossa jovem ciência.
Tanto na pessoa normal como naquelas que apresentam distúrbios tropeçamos com uma série de expressões mímicas e verbais e com numerosos produtos mentais que não chegaram a ser até agora objeto da psicologia por tê-los considerado meramente como resultados de uma perturbação orgânica ou de uma diminuição da capacidade funcional do aparato psíquico. Refiro-me aos atos falhos (equívocos orais ou na escrita, esquecimentos, etc.), aos atos casuais e aos sonhos dos normais e aos ataques convulsivos, delírios, visões, idéias e atos obsessivos dos neuróticos. Estes fenômenos enquanto não passaram, como os atos falhos, totalmente inadvertidos  têm sido atribuídos à patologia, que se esforça para encontrar para eles explicações fisiológicas que jamais resultaram satisfatórias. A psicanálise demonstrou, em troca, que todos estes fenômenos podem ser explicados e integrados no conjunto conhecido do suceder psíquico por meio da hipótese de natureza puramente psicológica. Nossa disciplina restringiu assim o raio de ação da fisiologia,
conquistando, em troca, para a psicologia uma parte considerável da patologia. A máxima força probatória corresponde aqui aos fenômenos normais, sem que se possa acusar a psicanálise de transferir ao normal conhecimentos extraídos do material patológico, pois aporta suas provas independentemente umas das outras em cada um de tais setores e mostra assim que os processos normais e os chamados patológicos seguem as mesmas regras.
Dos fenômenos normais a que estamos nos referindo, isto é, dos observáveis nas pessoas normais, dedicaremos atenção preferencial a dois: os atos falhos e os sonhos.
Os atos falhos, ou seja, o esquecimento ocasional de palavras e nomes, o de propósitos, os equívocos orais na leitura e na escrita, o extravio de objetos, a perda definitiva dos mesmos, determinados erros contrários a nosso melhor conhecimento, alguns gestos e movimentos habituais; tudo isto que reunimos sob o nome comum de atos falhos do ser humano são e normal tem sido, em geral, muito pouco atendido pela psicologia, atribuindo-se à “distração” e considerando-se derivado da fadiga, da falta de atenção ou de um afeto acessório de certos estados patológicos leves. A investigação analítica demonstrou com suficiente certeza que tais fatores mencionados constituem circunstâncias favoráveis à produção dos fenômenos de referência, mas nunca condições indispensáveis da mesma. Os atos falhos são verdadeiros fenômenos psíquicos e trazem consigo sempre um sentido e uma tendência, constituindo a expressão de determinadas intenções, que em conseqüência da situação psicológica dada não encontram outro meio de exteriorizar-se. Tal situação é, em geral, a correspondente a um conflito psíquico e nela fica privada de expressão direta e derivada por caminhos indiretos a tendência vencida. O indivíduo que comete o ato falho pode dar-se conta dele e pode conhecer separadamente a tendência reprimida que em seu fundo existe, mas ignora, em troca, quase sempre e até que a análise o revele, a relação causal que existe entre a tendência e o ato. As análises dos atos falhos são, muitas vezes, fáceis e rápidas. Uma vez advertido o falho pelo sujeito, sua primeira ocorrência costuma trazer consigo a explicação buscada.
Os atos falhos constituem o material mais cômodo para confirmar as hipóteses psicanalíticas.Em um trabalho que data de 1904 reuni numerosos exemplos desta ordem, com sua interpretação correspondente, coleção que foi logo aumentada pelos aportes de outros observadores.
O motivo que mais freqüentemente nos move a reprimir uma intenção obrigando-a assim a contentar-se com achar expressão indireta em um ato falho, é a evitação de desprazer. Deste modo, esquecemos fortemente um nome próprio quando abrigamos em direção à pessoa a quem corresponde um secreto mal-estar ou deixamos de realizar propósitos que somente a contragosto teríamos levado a cabo, forçados, por exemplo, pelas conveniências sociais. Perdemos um objeto quando nos tornamos inimigos da pessoa a quem nos recorda ou de quem o ganhamos. Tomamos um trem errado quando empreendemos a viagem a contragosto e gostaríamos de permanecer onde estávamos a nos deslocar para um lugar distinto. Onde mais claramente se apresenta a evitação de desprazer como causa destas falhas funcionais é no esquecimento de impressões e experiências,
circunstância observada já por autores pré-analíticos. A memória é muito parcial e apresenta uma grande disposição para excluir da reprodução aquelas impressões às quais se une um afeto penoso, ainda que nem sempre o consiga.
Em outros casos, a análise de um ato falho resulta menos sensível e conduz a soluções menos transparentes devido à intervenção de um processo, ao qual damos o nome de deslocamento. Assim, quando esquecemos o nome de uma pessoa contra a qual nada temos, a análise nos faz ver que tal nome despertou associativamente a recordação de outra pessoa de nome igual ou semelhante que nos inspira desgosto. O esquecimento do nome da pessoa inocente foi conseqüência de tal relação, resultando assim que a intenção de esquecer sofreu uma espécie de deslocamento no percurso de um determinado caminho associativo.
A intenção de evitar desprazer não é a única causa dos atos falhos. A análise descobre em muitos casos outras tendências que, havendo sido reprimidas na situação correspondente, tiveram de se manifestar como perturbações de uma função. Assim, os equívocos orais denunciam muitas vezes pensamentos que o sujeito gostaria de manter ocultos a seu interlocutor. Vários grandes poetas compreenderam este sentido de tais equívocos e os empregaram em suas obras. A perda de objetos valiosos resulta ser muitas vezes um sacrifício, encaminhado a afastar uma desgraça temida, não sendo esta a única superstição que ainda se impõe às pessoas cultas sob a forma de um ato falho. O extravio temporal de objetos não é senão a realização inconsciente do desejo de vê-los desaparecer, e sua destruição, a de substituí-los por outros melhores.
A explicação psicanalítica dos atos falhos traz consigo, não obstante a insignificância desses fenômenos, certa modificação de nossa concepção do mundo. Além disso, achamos que a pessoa normal aparece movida por tendências contraditórias com muito mais freqüência do que suspeitávamos. O número de acontecimentos aos que damos o nome de “casuais” fica consideravelmente limitado. De certo modo, é consolador pensar que a perda de objetos não constitui quase nunca uma casualidade, e que nossa distração não é muitas vezes senão um disfarce de intenções ocultas. Muito mais importante é o descobrimento analítico de uma participação inconfessada da própria vontade do sujeito em numerosos acidentes graves, que de outro modo teriam sido atribuídos à casualidade. Este achado da psicanálise vem a tornar mais difícil a diferenciação entre a morte por acidente casual e o suicídio, já tão difícil na prática.
A explicação dos atos falhos apresenta um inegável valor teórico pela simplicidade da solução e a freqüência de tais fenômenos na pessoa normal. Mas como resultado da psicanálise, não é comparável em importância ao obtido na sua aplicação a outro fenômeno distinto da vida psíquica das pessoas saudáveis. Refiro-me à interpretação dos sonhos, com a qual começa a psicanálise a situar-se diante da ciência oficial. A investigação médica considera os sonhos como um fenômeno puramente somático, desprovido de todo sentido e significação, não vendo nele senão a reação do órgão psíquico, adormecido, a estímulos somáticos, que o forçam a despertar parcialmente. A psicanálise, superando a singularidade, a incoerência e o absurdo do fenômeno onírico, eleva-o à categoria de um ato psíquico que possui sentido e intenção próprios e ocupa um lugar na vida psíquica do indivíduo. Para ela, os estímulos somáticos não são senão um dos materiais que a formação dos sonhos elabora. Entre estas duas concepções dos sonhos não há acordo possível.
Contra a concepção fisiológica, testemunha a sua infertilidade. A favor da psicanálise pode se acrescentar o fato de ter traduzido com pleno sentido e aplicado ao descobrimento da mais íntima vida psíquica do ser humano milhares de sonhos.
Em um trabalho publicado em 1900 (A interpretação dos sonhos), tratei o importantíssimo tema da interpretação dos sonhos, tendo logo a satisfação de comprovar que quase todos os meus colaboradores na investigação psicanalítica confirmaram e impulsionaram, com seus próprios aportes, as teorias que iniciei neste trabalho. Hoje já se reconhece unanimemente que a interpretação dos sonhos é a pedra angular do trabalho psicanalítico e que seus resultados constituem a mais importante contribuição da psicanálise à psicologia.
Não me é possível expor aqui a técnica por meio da qual se chega à interpretação dos sonhos, nem tampouco fundamentar os resultados aos quais a elaboração psicanalítica dos mesmos conduziu. Portanto, me limitarei a assinalar alguns novos conceitos, comunicar os resultados analíticos e acentuar sua importância para a psicologia normal.
Assim, pois, a psicanálise nos ensina o seguinte: Todo sonho possui um sentido; sua singularidade procede das deformações que sofreu sua expressão; seu absurdo é intencionado e expressa o engano, o insulto e a contradição; sua incoerência é diferente para a interpretação. O que do sonho recordamos ao despertar não é senão seu conteúdo manifesto. Aplicando a este conteúdo manifesto a técnica interpretadora, chegamos às idéias latentes que se escondem por trás dele, confiando a ele sua representação. Estas idéias latentes já não são singulares, incoerentes nem absurdas, senão elementos plenamente significativos de nosso pensamento desperto. O processo que transformou as idéias latentes do sonho no conteúdo manifesto dele é designado por nós com o nome de elaboração do sonho, e é o que leva a cabo a deformação, em conseqüência da qual já não reconhecemos no conteúdo do sonho as suas idéias.
A elaboração onírica é um processo de uma ordem desconhecida antes em psicologia e apresenta um interesse duplo. Em primeiro lugar nos revela processos novos, tais como a condensação (de representações) e o deslocamento (do acento psíquico de uma representação a outra), que não encontramos no pensamento desperto ou apenas como base dos chamados erros mentais. Mas, além disso, permite-nos decifrar na vida psíquica um dinamismo cuja ação permanecia oculta a nossa percepção consciente. Salientamos que existe em nós uma censura, uma instância examinadora que decide se uma representação emergente deve ou não chegar à consciência, e exclui rigorosamente, dentro de seu raio de ação, tudo o que pode produzir desprazer ou despertá-lo de novo.
Recordaremos que tanto esta tendência a evitar o desprazer provocado pela recordação como dos conflitos surgidos entre as tendências da vida psíquica encontramos já indícios na análise dos atos falhos.
O estudo da elaboração dos sonhos nos impõe uma concepção da vida psíquica que parece resolver as questões mais discutidas da psicologia. A elaboração onírica nos obriga a supor a existência de uma atividade psíquica inconsciente mais ampla e importante que a ligada à consciência, e já conhecida e explorada. (Sobre este ponto retornaremos ao nos ocuparmos do interesse filosófico da psicanálise). Assim mesmo, permite-nos levar a cabo uma articulação do aparato psíquico em várias instâncias ou sistemas, e demonstra que no sistema da atividade psíquica inconsciente se desenvolvem processos de natureza muito distinta da dos que são percebidos na consciência.

A função da elaboração onírica não é senão a de manter o estado de repouso. “O sonho (fenômeno onírico) é o guardião do estado de repouso”. Por sua parte, as idéias do sonho podem achar-se ao serviço das mais diversas funções psíquicas. A elaboração onírica cumpre sua tarefa, representando realizado, em forma alucinatória, um desejo emergente das idéias do sonho.
Pode dizer-se sem temores que o estudo psicanalítico dos sonhos procurou a primeira visão de uma psicologia abismal ou psicologia do inconsciente não cogitada até agora. A psicologia normal terá, pois, de sofrer modificações fundamentais para harmonizar-se com estes novos conhecimentos.
Não nos é possível levar a cabo, dentro dos limites deste trabalho, uma exposição completa do interesse psicológico da interpretação dos sonhos. Deixando bem afirmado que os sonhos são um fenômeno dos descobrimentos trazido à psicologia pela psicanálise no terreno patológico.
Se as novidades psicológicas deduzidas do estudo dos sonhos e dos atos falhos possuem existência e valores reais, terão de nos ajudar a explicar outros fenômenos. Assim sucede, em efeito, e a psicanálise demonstrou que as hipóteses da atividade psíquica inconsciente, a censura e a repressão, a deformação e a produção de substitutivos, deduzidas da análise daqueles fenômenos normais, nos facilitam pela primeira vez a compreensão de toda uma série de fenômenos patológicos, proporcionando-nos, por assim dizer, a chave de todos os enigmas da psicologia das neuroses. Os sonhos se constituem deste modo no protótipo normal de todos os produtos psicopatológicos e sua compreensão nos revela os mecanismos psíquicos das neuroses e psicoses.
Partindo de suas investigações sobre os sonhos a psicanálise pode edificar uma psicologia das neuroses, que um trabalho continuado vai tornando cada vez mais completo. Para a demonstração, que tentamos fazer aqui, do interesse psicológico de nossa disciplina, só necessitamos tratar com certa amplitude dois pontos daquele amplo conjunto: a demonstração de que muitos fenômenos da patologia que se acreditavam dever explicar fisiologicamente são atos psíquicos, e a de que os processos que produzem os resultados anormais podem ser atribuídos a forças motoras psíquicas.
Tornaremos clara a primeira destas afirmações com alguns exemplos. Os ataques histéricos foram reconhecidos, há muito tempo, como signos de uma elevada excitação emotiva e comparados às explosões de afeto. Charcot tentou incluir a diversidade de suas formas em fórmulas descritivas. J. Janet descobriu a representação inconsciente que atua por trás destes ataques. A psicanálise viu nestas representações mímicas de cenas vividas ou fantasiadas que ocupam a imaginação do enfermo sem que ele tenha consciência delas. O sentido de tais pantomimas fica velado aos olhos do espectador por meio de condensações e deformações dos atos representados. Este ponto de vista resulta aplicável a todos os demais sintomas típicos dos enfermos histéricos.
Todos eles são, em efeito, representações mímicas ou alucinatórias, de fantasias que dominam inconscientemente sua vida emotiva, e significam uma satisfação de secretos desejos reprimidos. O caráter atormentador destes sintomas procede do conflito interior provocado na vida anímica de tais enfermos pela necessidade de combater tais impulsos optativos inconscientes.
Em outra afecção neurótica  a neurose obsessiva  os pacientes ficam sujeitos à penosa execução de um cerimonial sem sentido aparente, constituído pela repetição de atos totalmente indiferentes, tais como os de lavar-se ou vestir-se, a obediência a preceitos insensatos ou a observação de misteriosas inibições. Para o trabalho psicanalítico constituiu um triunfo chegar a demonstrar que todos estes atos obsessivos, até os mais insignificantes, possuem pleno sentido e refletem por meio de um material indiferente os conflitos da vida, a luta entre as tentações e as coerções morais, o mesmo desejo rechaçado e os castigos e penitências com os que se quer compensar. Em outra distinta forma da mesma enfermidade o sujeito sofre idéias penosas, representações obsessivas cujo conteúdo se impõe imperiosamente, acompanhadas de afetos cuja natureza e intensidade não correspondem quase nunca ao conteúdo das idéias obsessivas. A investigação analítica demonstrou aqui que tais afetos se acham perfeitamente justificados, correspondendo a reprovações baseadas, pelo menos, em uma realidade psíquica. Mas as idéias atribuídas a tais afetos não são já as primitivas, senão outras distintas, ligadas a eles por um deslocamento (substituição) de algo reprimido. A redução destes deslocamentos abre o caminho até o conhecimento das idéias reprimidas e nos demonstra que a ligação do afeto e representação é perfeitamente adequada.
Em outra afecção nervosa, a incurável demência precoce (parafrenia, esquizofrenia) na qual os enfermos mostram uma absoluta indiferença, achamos freqüentemente como únicos atos certos movimentos e gestos, uniformemente repetidos, aos que se deu o nome de “estereotipias”. A investigação analítica de tais atos (levada a cabo por C. G. Jung) permitiu reconhecer neles resíduos de atos mímicos plenos de sentido, por meio dos quais os impulsos optativos que dominavam o sujeito criavam antes uma expressão. A aplicação das hipóteses analíticas aos discursos mais absurdos e às atitudes e gestos mais singulares destes enfermos permitiu sua compreensão e sua integração na vida psíquica conjunta do sujeito.
Analogamente, sucede com os delírios, alucinações e sistemas delirantes de outros diversos enfermos mentais. Ali onde parecia reinar a mais singular arbitrariedade o trabalho psicanalítico descobriu uma norma, uma ordem e uma coerência. As mais diversas formas patológicas psíquicas foram reconhecidas como resultados de processos idênticos, no fundo, suscetíveis de ser apreendidos e descritos por meio de conceitos psicológicos. Em todas as partes achamos a atuação do conflito psíquico descoberto na elaboração dos sonhos: a repressão de determinados impulsos instintivos, rechaçados ao inconsciente por outras forças psíquicas; os produtos reativos das forças repressoras e os produtos substitutivos das forças reprimidas, mas não despojadas totalmente de sua energia. Por todas as partes também encontramos nestes processos aqueles outros  a condensação e o deslocamento  que nos foram dados a conhecer pelo estudo dos sonhos. A diversidade das formas patológicas observadas na clínica de psiquiatria depende de outros dois fatores: da
multiplicidade dos mecanismos psíquicos de que dispõe o trabalho da repressão e da multiplicidade das disposições histórico-evolutivos que permitem aos impulsos reprimidos chegar a constituir-se em produtos substitutivos.
Uma boa metade do trabalho psiquiátrico é encomendada pela psicanálise à psicologia. Mas constituirá um grave erro supor que a análise aspira a uma concepção puramente psicológica das perturbações psíquicas. Não pode desconhecer que a outra metade do trabalho psiquiátrico tem por conteúdo a influência de fatores orgânicos (mecânicos, tóxicos, infecciosos) sobre o aparato psíquico. Na etiologia dos transtornos psíquicos não admite, nem ainda para os mais leves, como o são as neuroses, uma origem puramente psicógena, senão que busca sua motivação na influência da vida psíquica por um elemento indubitavelmente orgânico, do qual mais tarde trataremos.
Os resultados psicanalíticos, suscetíveis de alcançar uma importante significação para a psicologia geral, são demasiado numerosos para que possamos detalhá-los neste breve trabalho. Unicamente citaremos, sem nos determos em seu exame, dois pontos determinados: o modo inequívoco em que a psicanálise reclama para os processos afetivos a primazia na vida psíquica e sua demonstração de que na pessoa normal se dá, o mesmo que na enferma, uma indiscutível perturbação e ofuscamento afetivo do intelecto.


segunda-feira, 10 de março de 2014

CURSO LIVRE DE CAPACITAÇÃO EM PSICANÁLISE


SOCIEDADE PSICANALÍTICA ORTODOXA DO BRASIL
A SPOB-RS está com as inscrições abertas para o Grupo IX de capacitação de psicanalistas em Porto Alegre, Inicio prevista para o mês de agosto-2015
Objetivo: Promover o ensino e a pesquisa da ciência psicanalítica a partir do pensamento freudiano e demais escolas que estruturam a base do saber Psicanalítico. Fomentar de maneira séria e fidedigna de conhecimento das teorias e a prática em Psicanálise.
A Psicanálise aplica-se a todas as áreas da Vida Humana. Pode ser utilizada para todas as vertentes da Ciência Humana - através do conhecimento das causas que angustiam e origem dos comportamentos e inquietações. É a ciência e arte de entender a si e o outro, buscando proporcionar o equilíbrio mental para melhor desempenho das atividades pessoais e profissionais.
A todos os profissionais com curso superior  ou em fase de conclusão, em qualquer área do conhecimento.
O Curso se baseia nos ensinamentos de Sigmund Freud e apreciação das vertentes:
Melaine Klein, Jacques Lacan, Donald W. Winnicott, Wilfred Ruprecht Bion e os outros psicanalistas contemporâneos.
·         28 módulos presenciais uma vez ao mês num final de semana.
·          Resenhas mensais e monografia de formação.
·         2.128 horas total.      
·         Apostilas atualizadas com visão da psicanálise contemporânea.
·         Corpo docente de vários estados do país.
·         Certificado pela SPOB – Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil – a maior sociedade de psicanalistas da América Latina.
·         Grupo com 30 alunos, garanta a sua vaga. Ficha de matricula no anexo.
Local: a ser divulgado
Início: previsto para Março, 2014. Se for alcançado o nº suficiente de alunos
Inscrições; Porto Alegre – RS - Coordenador Castilho Sanhudo.
End. Rua Profº Annes dias,166/103 - fones (51) 84497408 / 3024 7559
e-mail- castilhoss28@hotmail.com  -  spobpolors@gmail.com
Em Santa Catarina.
Antonio Lopes - Psicanalista Didata
Professor e coordenador do Curso de Psicanálise da SPOB em Santa Catarina.
Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil
(47) 3081 2665 / 9923 4913 TIM / 8462 5692 OI

antonio@psicnalisesc.com.br

Os Sete Pecados Capitais

Os Sete Pecados Capitais

os sete pecados capitais se relacionam com as doenças mentais — cristianismo e psi­canálise têm vários pontos de convergência — para a psicanálise também são importan­tes o respeito e a disciplina — o prazer não pode ser considerado um pecado

VIII
Orgulho
O orgulho está extremamente ligado à inveja. Quanto mais orgulhoso, mais invejoso se fica. Em psicanálise, o nome técnico do orgulho é narcisismo. Numa medida ampla, não é sinal de doença; é até sinal de saúde. Do orgulho é que deriva nossa capacidade de gostarmos de nós mesmos. E o próprio Cristo disse: “Amai ao próximo, como a vós mes­mos.” Jamais, portanto, considerou pecado alguém se amar, interessar-se por si e por suas coisas. A afeição do ego por si próprio é parte da vida, parte inclusive indispensável dela. Sem esse amor autocentrado, estaríamos todos mortos. Uma certa dose de narcisismo, vaidade e orgulho faz parte da natureza humana, no esplendor de sua saúde.
Contudo, orgulho demais nos torna competitivos de­mais. Quando nos tornamos competitivos demais, simples­mente não podemos mais nos afeiçoar a ninguém, o que frustra nosso desejo de amar e ser amado.
O orgulho em excesso gera, além disso, uma vaidade doentia, uma das principais causas da insegurança e da timi­dez. Explico-me melhor. Quanto mais vaidosos, mais me­lindrados ficamos. Se não conseguimos preencher expecta­tivas de esplendor e glória, caímos na mais cava depressão, na mais aguda insegurança quanto ao nosso valor.
Além de tudo o mais, o orgulho em demasia gera um estado de arrogância, de não poder reconhecer erros ou aprender nada com ninguém. Tudo se torna motivo para que a pessoa se sinta humilhada. Essa é uma das principais origens do comportamento presunçoso, isto é, do compor-
sabichão e que não passa de um cabeça-dura.
Nos níveis mais graves, o orgulho transtorna todo o processo de aprendizagem intelectual e afetiva. Muitas es­quizofrenias e graves depressões são causadas pelo orgulho desmedido.

IX

Luxúria
A luxúria é um tema polêmico e sujeito a controvérsias, tanto dentro do cristianismo quanto da psicanálise. Todos concordam que a luxúria existe e que é algo perturbador de nossas vidas. A dificuldade reside em sua definição. Onde termina o sexo sadio e onde se inicia a luxúria? Certamente as mulheres e os homens desinteressados pelo sexo não são considerados sadios nem pelo cristianismo nem pela psi­canálise. A castidade, enaltecida pelo cristianismo, jamais se confunde com sexo reprimido e inexistente. Trata-se de uma virtude, exatamente porque implica em conviver com a tentação da carne, as volúpias do corpo, os desejos do sexo. Castidade sem desejo não é virtude. É neurose. Nesse ponto, há concordância dos psicanalistas.
Uma boa definição de luxúria seria atribuir ao sexo — que todos concordamos ter uma importância imensa — uma importância maior ainda. Mais uma vez, uma das partes do todo quer subjugar o todo. Sexo é importante? Claro que é. Mas existem outras coisas importantes também. Se ele se toma a única coisa importante do mundo, converte-se em um prazer que impossibilita outros prazeres. Prazeres como, por exemplo, os do espírito, do amor, da justiça, da fraterni­dade, etc. Ou será que constituir uma família, amar uma mulher, criar filhos, constituir uma profissão, realizar o bem comum também não são prazeres? Quem foi que disse que prazer é só sexo? Só um sexomaníaco pensaria tal coisa.
A excessiva valorização do erótico preocupa os psica­nalistas. Sem dúvida, ela prejudica — sem qualquer puritanismo — a realização mais plena de uma vida humana. Afinal, se sexo é vida, vida não é sexo. Inclui sexo, mas é bem maior do que isso.
Várias são as causas que podem levar a uma supervalorização do sexo, ou seja, à luxúria. Por incrível que pareça, uma das mais importantes é uma crônica desconfiança quanto ao valor das próprias emoções. Emoções que des­confiam de seu poder de emocionar buscam permanentes reafirmações. E o sexo, por seu jogo intenso de emoções, por sua aparência de entrega dramática (digo aparência, porque é discutível se a entrega é tão dramática assim) repre­senta uma enorme tentação para os inseguros. No fundo, as pessoas assim inseguras não amam o sexo tanto quanto dizem. Estão apenas viciadas na ilusão de entrega que ele provoca.