Os Sete Pecados Capitais
os sete pecados capitais se relacionam com
as doenças mentais — cristianismo e psicanálise têm vários pontos de
convergência — para a psicanálise também são importantes o respeito e a
disciplina — o prazer não pode ser considerado um pecado
VIII
Orgulho
O orgulho está extremamente ligado à inveja. Quanto mais orgulhoso, mais invejoso se fica. Em psicanálise, o
nome técnico do orgulho é narcisismo. Numa medida ampla, não é sinal de doença;
é até sinal de saúde. Do orgulho é que deriva nossa capacidade de gostarmos de
nós mesmos. E o próprio Cristo disse: “Amai ao próximo, como
a vós mesmos.” Jamais, portanto, considerou
pecado alguém se amar, interessar-se por si e por suas coisas. A afeição do ego
por si próprio é parte da vida, parte inclusive indispensável dela. Sem esse
amor autocentrado, estaríamos todos mortos. Uma certa dose de narcisismo,
vaidade e orgulho faz parte da natureza humana, no esplendor de sua saúde.
Contudo, orgulho demais nos torna competitivos demais. Quando nos tornamos
competitivos demais, simplesmente não podemos mais
nos afeiçoar a ninguém, o que frustra nosso desejo de
amar e ser amado.
O orgulho em excesso gera, além disso, uma vaidade doentia, uma das
principais causas da insegurança e da timidez. Explico-me melhor. Quanto mais vaidosos, mais melindrados ficamos. Se não
conseguimos preencher expectativas de
esplendor e glória, caímos na mais cava
depressão, na mais aguda
insegurança quanto ao nosso valor.
Além de tudo o mais, o
orgulho em demasia gera um estado de arrogância, de não poder reconhecer erros
ou aprender nada com ninguém. Tudo se torna motivo para que a pessoa se sinta
humilhada. Essa é uma das principais origens do comportamento presunçoso, isto
é, do compor-
sabichão e que não passa de
um cabeça-dura.
Nos níveis mais graves, o
orgulho transtorna todo o processo de aprendizagem intelectual e afetiva.
Muitas esquizofrenias
e graves depressões são causadas pelo orgulho
desmedido.
IX
Luxúria
A luxúria é um tema polêmico e sujeito a
controvérsias, tanto dentro do cristianismo quanto da psicanálise. Todos
concordam que a luxúria existe e
que é algo perturbador de nossas vidas. A dificuldade reside em sua definição.
Onde termina o sexo sadio e onde se inicia a luxúria? Certamente as mulheres e os homens
desinteressados pelo sexo não são considerados sadios nem pelo cristianismo nem
pela psicanálise. A castidade, enaltecida pelo cristianismo, jamais se
confunde com sexo reprimido e inexistente. Trata-se de uma virtude, exatamente
porque implica em conviver com a tentação da carne, as volúpias do corpo, os desejos do sexo.
Castidade sem desejo não é virtude. É neurose. Nesse ponto, há concordância dos
psicanalistas.
Uma
boa definição de luxúria seria
atribuir ao sexo — que todos concordamos ter uma importância imensa — uma
importância maior ainda. Mais uma vez, uma das partes do todo quer subjugar o
todo. Sexo é importante? Claro que é. Mas existem outras coisas importantes
também. Se ele se toma a única coisa importante do mundo, converte-se em um
prazer que impossibilita outros prazeres. Prazeres como, por exemplo, os do
espírito, do amor, da justiça, da fraternidade, etc. Ou será que constituir
uma família, amar uma mulher, criar filhos, constituir uma profissão, realizar
o bem comum também não são prazeres? Quem foi que disse que prazer é só sexo?
Só um sexomaníaco pensaria tal coisa.
A
excessiva valorização do erótico preocupa os psicanalistas. Sem dúvida, ela
prejudica — sem qualquer puritanismo
— a realização mais plena de uma vida humana. Afinal, se sexo é vida, vida não
é sexo. Inclui sexo, mas é bem maior do que isso.
Várias
são as causas que podem levar a uma supervalorização do sexo, ou seja, à luxúria. Por incrível que pareça, uma das
mais importantes é uma crônica desconfiança quanto ao valor das próprias
emoções. Emoções que desconfiam de seu poder de emocionar buscam permanentes
reafirmações. E o sexo, por seu jogo intenso de emoções, por sua aparência de
entrega dramática (digo aparência, porque é discutível se a entrega é tão
dramática assim) representa uma enorme tentação para os inseguros. No fundo,
as pessoas assim inseguras não amam o sexo tanto quanto dizem. Estão apenas
viciadas na ilusão de entrega que ele provoca.
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