O mundo na atualidade se agita em torno de uma crise que
ao olhar psicanalítico estão tomando contornos de uma angústia não apenas
individual, mas também grupal ante ao caos que se anuncia. A felicidade e a
angústia estão intimamente ligadas a fatores econômicos e agressivos de um
grande mal estar, como já dizia Freud em seu artigo “O mal estar na
civilização”. A pós-modernidade, assim
nomeada por alguns teóricos, é marcada pelo efêmero momento em que o “ser” se
amarra ao “ter”, aos símbolos de poder, status e cidadania, construídos pelo
prestígio social e pertencencimento a determinada classe. O mundo atual e real
exige do indivíduo um esforço muito grande para viver ante às restrições
impostas ao projeto de vida da grande maioria da população onde a distribuição
de renda é uma das mais injustas. Como sobreviver à angústia de aniquilamento
ante às frustrações, faltas, agressividade e crise de valores na sociedade
brasileira.
A psicanálise precisará
problematizar sua prática e compor construções teóricas emprestando elementos
de outras áreas das ciências humanas, para tratar o “homem moderno” em seu
ambiente cultural e seus instituintes dessa cultura. A melhoria de vida se
institui pelo modelo repressivo causador do adoecimento do sujeito que forma e
é formado pelo meio onde atua e vive.
Há muitas décadas a Psicanálise
empresta sua leitura para pensar o homem a partir de sua cultura, levantando a
discussão em relação a esta e desta com o homem. Segundo Bleger, a psicanálise
pode ser considerada como fato científico, como acontecimento histórico-social,
com ideologia em si mesma, ou como integrante de uma ideologia, validada pela
terapêutica, pela investigação e pela teoria.
Freud afirmava que “os sentimentos
sociais repousam nas identificações com outras pessoas, na base de possuírem o
mesmo ideal de ego”. A psicanálise deve
analisar o homem ante a crise inserido em sua cultura. O contexto histórico e
social é crucial na para a formação do ego e seu enfrentamento com os problemas
da atualidade. O sujeito que sofre e se
vê como “culpado”, “incompetente”, “desesperado” ou simplesmente doente,
assustado procura o profissional da área “psi”, e tudo isso comporá o quadro em
que o profissional da área atuará.
Na clínica encontramos sintomas de
ansiedade, pânico e depressão correlacionados a desemprego, poder aquisitivo,
impossibilidade de manter determinado padrão de educação e social para seus
filhos, entre outros tantos. Quadros de adoecimento, como manifestações
psicossomáticas afastam as possibilidades de recuperação e de representação
desse sofrimento. Leituras simplistas ou que remetam a padrões infantis e
individuais, ou essa leitura remeter a incapacidade de adaptação, são
possíveis, porém com certeza não serão completas ou darão conta de integrar e
de forma saudável ao mundo em que vive no momento, com diminuição da capacidade
d contemplar suas necessidades primordiais.
As características da
pós-modernidade são as patologias que se instauram pelo desamparo, pela solidão
e pela falta de referências simbólicas. Segundo Norberto Elias em O processo de
civilização: “o individualismo é uma ilusão que custa ao sujeito o esquecimento
(recalque) não só de sua filiação, mas de sua pertinência a uma ou a várias
comunidades, mais ou menos abstratas, de ‘irmãos’ que sofrem como ele, lutam
como ele, sentem-se desamparados como ele”.
O sujeito sozinho, desamparado e
abandonado, facilmente pode cair na rede de seu psiquismo regida pela pulsão de
morte. O empobrecimento nas relações afetivas conduzem a uma busca de
compensações por meio de uma ganância por ganhos, por bens de consumo, por uso
de drogas, por sexualidade promíscua entre outros. O sujeito contemporâneo é
diferente do sujeito freudiano. Na atualidade as pessoas não lembram dos seus
sonhos, não fazem lapsos e não fantasiam, enquanto o sujeito freudiano é uma
pessoa que questiona o sentir, que sonha, buscam o olhar do outro como que para
provar a própria existência.
É dentro destes aspectos fantasmáticos,
de mudanças nas expressões dos sintomas que precisamos refletir não só sobre as
psicopatologias que afligem o ser humano que chega clínica, mas principalmente
discutir a prática clínica que mais se adapta a cada sujeito portador de um
sofrimento psíquico. A possibilidade de encontrar um espaço- tempo para “o
cuidar do outro” se estreita cada vez mais, pois o cuidar, a atenção e o tempo
devotado ao outro sofre restrições de toda a ordem nos dias atuais. Aquele
cuidado que uma mãe suficientemente boa não pode dispensar ao seu bebê, o
quanto ela possa ter sido menos disponível corresponde a uma maior exposição ao
desamparo e à angústia de aniquilamento. Esse bebê que se percebeu fraco diante
de suas necessidades não atendidas tende a viver estas faltas e frustrações
pela vida com muita angústia e tende a um adoecimento, será o adulto que chega
à clínica nestes tempos da pós-modernidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário